Ainda somos fortemente influenciados pela cultura grega. Na Mitologia
os gregos mostravam, por meio do mito de Pandora, a misoginia. Pandora
trouxe o mal ao mundo, assim como Eva na cultura judaico cristã.
Mas isso não é totalmente negativo. O feminino estar próximo
ao mal, significa que está mais próximo ao humano e com possibilidade de
desenvolvimento maior, pois tem mais familiaridade com a sombra.
Os gregos também possuíam muito medo da deusa Afrodite. Deusa da
sexualidade feminina, da fertilidade, do amor e sedução, vivia seu
desejo da forma que lhe convinha. Era a deusa mais bela, mais desejada e
invejada do panteão.
Esse medo é retratado no mito do encontro da deusa com o mortal Anquises.
A deusa, ao ver o mortal se apaixona e decide entrar na tenda do
rapaz e quando ele a vê a saúda como uma imortal, prometendo-lhe um
altar e sacrifícios, e suplicando-lhe a bênção para ele e sua
posteridade. Diante do medo, a deusa mente, dizendo ser uma donzela
mortal, uma princesa frígia que também sabia falar a língua dos
troianos. O mortal deita-se com a deusa imortal, sem saber o que estava
fazendo. Afrodite desperta o amante adormecido e mostra-se a ele em sua
verdadeira forma e beleza. Anquises fica assustado quando viu os lindos
olhos dela. Virou-se para o outro lado, cobriu o rosto e implorou-lhe
que o salvasse. Pois nenhum homem mortal continua gozando de boa saúde
pelo resto da vida depois de haver dormido com uma deusa. Com ele então,
concebe Enéias. Mas de sua parte, a deusa lamentou haver-se entregue a
um mortal.
O medo da sexualidade afrodisíaca da mulher ainda persiste em
nossa sociedade Ocidental. O medo de ser subjugado pelo desejo feminino
ainda vive no homem moderno.
Além disso, em civilizações anteriores as deusas do amor e
fertilidade também eram deusas da magia, da guerra e da morte, como a
nórdica Freya, por exemplo. Amor e guerra sempre foram faces da mesma
moeda.
Os gregos retiraram a qualidade guerreira de Afrodite e
projetaram em seu amante Ares, que, por sua vez, também era rejeitado
pelos gregos, por sua impulsividade e caráter agressivo. Os dois amantes
eram uma ameaça ao patriarcado nascente à época.
A deusa da guerra para os gregos era Atena. Deusa da estratégia de
guerra, da civilização, da cultura, diplomacia e da sabedoria. Era tida
em alta conta pelos romanos e era a favorita de seu pai Zeus, o grande
senhor do Olimpo.
Era casta, virgem e moderada. Ela inspirava os heróis com sua
sabedoria e podia ser tão implacável quanto Ares, mas mantinha
distância das paixões. Bem diferente da impetuosa Freya, suas ações eram
movidas pela estratégia e frieza.
É possível que em tempos remotos Atena tenha sido uma deusa da
fertilidade e tido o caráter maternal de todas as Grandes Mães da
pré-história, no entanto, foi “domesticada”, formando um duplo sombrio
com Afrodite.
Além disso, Atena e seu irmão Hefesto aparecem frequentemente
juntos na arte grega, ambos são considerados co-instrutores da
humanidade nas artes, e em vários lugares dividiam um culto em tempos
remotos, o que sugere que em uma fase primitiva, não documentada,
Hefesto pode ter sido um esposo de Atena.
Atena sendo levada em tão alta conta e sendo separada de seus
atributos originais, mostra a nós que as qualidades femininas levadas em
consideração atualmente, são a moderação dos instintos e a castidade.
No entanto, as Deusas da fertilidade clamam sua volta. Essa
sombra reprimida precisa ser olhada novamente. O amor e a guerra, a
fertilidade e a exuberância da sexualidade e sensualidade femininas
precisam ser novamente compreendidas para assim deixarem de ser temidos.
Afrodite ainda sobreviveu na cultura grega e possuía seu culto, mas
infelizmente hoje, na cultura cristã ela foi suprimida. Ainda enxergamos
aspectos femininos como Pandora e Eva. Precisamos de um novo olhar para
o feminino, que una novamente esses aspectos separados.
Referências:
BRANDÃO, J. – Mitologia Grega Vol. 1, Petrópolis: Vozes, 1986
BOLEN, J. S. – As Deusas e a Mulher. São Paulo: Paulus, 1990
CAMPBELL, J. O Poder do Mito. São Paulo: Palas Athena, 1990.
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